07/12/2009

A POSTURA DOS PARTIDOS POLÍTICOS E DA SOCIEDADE CIVIL NA ELABORAÇÃO DA FUTURA CONSTITUIÇÃO - QUINTAS DE DEBATE -Clarisse Kapuru

Na úçtima edição do QUINTAS DE DEBATE, a deputada Clarisse Kaputu falou da "postura dos partidos políticos e da Sociedade Civil na elaboração da futura Constituição".


1-Agradeço o convite que a Omunga me endereçou para participar nesta sessão e com os presentes podermos debater mais uma vez questões atinentes ao processo de elaboração da nova Lei Mãe de Angola. É um tema da actualidade e que merece uma atenção cuidada de todos os angolanos pois a democracia participativa, apela para a participação activa dos cidadãos na feitura das leis e no exercício da função fiscalizadora do Estado.

2-Os angolanos conseguiram verdadeiras conquistas e com um incomensurável sacrifício muitas vezes não reconhecido, de homens e mulheres anónimos que se bateram heroicamente pela independência e estoicamente pela democracia pluripartidária. Estas conquistas incluem a garantia dos direitos e liberdades fundamentais consagradas na actual Lei Constitucional que apesar de estarem expressas nem sempre são cumpridas: nem todos os angolanos tem uma habitação condigna, o acesso a escola é deficiente, com muitas crianças em todo o território fora do sistema de ensino, a saúde está doente e não consegue atender a demanda até dos casos mais comuns como a malária ou o sarampo. Este é o país real que convive no mesmo espaço com uma riqueza excessiva e ostentada, por parte de um número muito pequeno de compatriotas nossos e que todos nós já sabíamos mas o Presidente da Republica confirmou recentemente, essas riquezas advêm afinal da delapidação do erário público. Portanto não é suficiente a existência de uma Constituição. Ela tem de ser cumprida nos parâmetros estatuídos.

Sabemos todos nós que os órgãos de soberania do nosso Estado Angolano não são até agora todos eles resultantes do mandato democrático e do voto do cidadão e de concreto no que concerne ao Presidente da Republica. Depois de todas as promessas feitas pelo Presidente José Eduardo dos Santos não se vislumbra a sua concretização. Aliás agora há toda uma batucada para se tentar afirmar que já não é possível esta eleição sem a concretização efectiva da nova Constituição. Afinal a actual Lei Constitucional foi muito boa para o MPLA conseguir os 80% de que se gaba todos os dias mas, esta mesma Lei já não serve para a eleição do Presidente da República. Este facto tem implicações graves na vida da Nação Angolana que se encontra refém do Presidente da Republica que está a governar sem o mandato do povo mas condiciona a realização das eleições Presidenciais a elaboração da nova constituição. Na realidade não há nenhuma necessidade de se colar o processo constituinte a eleição do Presidente da Republica. Esta indefinição cria sérios constrangimentos relativos a seriedade do processo e chama a nossa atenção para a necessidade de não se deixar questões fundamentais ao critério de uma pessoa. Assim na matriz A de base presidencial e que incorpora o Anteprojecto da UNITA no seu artigo 136º estabelece as regras para a eleição definindo em concreto para “o mês de Setembro de cada ano que termina o mandato presidencial vigente” fim de citação. Assim a Constituição não dá poderes absolutos a uma só pessoa neste caso ao órgão Presidente da República a decisão das eleições.

Neste contexto a constituição vigente não só não perdeu a sua força normativa como ainda não cumpriu a sua função histórica pois a não realização das eleições presidenciais revela uma anormalidade constitucional que deve ser suprida com a sua concretização o mais breve possível e não com discursos de falta de verbas pois se há dinheiro para as pessoas se divertirem com o CAN de certeza que também existe orçamento para estas eleições aliás estas verbas já foram aprovadas no OGE para 2009.

Quando se iniciou com o Processo Constituinte por força da Lei que cria a Comissão Constitucional aprovada em 15 de Dezembro de 2008, não se tinha dito que neste processo estava implícita a não realização das eleições presidenciais mas, notou-se no decorrer dos seus trabalhos que a postura do MPLA tendia para a supressão destas eleições nos prazos estabelecidos e acordados pela Nação Angolana.

3-O empenho dos cinco partidos políticos com assento na Assembleia Nacional consistiu na elaboração de ante projectos que foram remetidos a Assembleia Nacional e a Comissão Constitucional os recepcionou e remeteu à Comissão Técnica e depois de analisados e estruturados se transformaram em três matrizes sendo a matriz A de base presidencial e que incorpora o anteprojecto da UNITA; a matriz B de base Semipresidencialista e que incorpora os anteprojectos do PRS e da FNLA, de acordo com a Comissão Técnica; e a última a matriz C que começou por ser de base parlamentar e que segundo os seus proponentes “evoluiu” para presidencialista parlamentar e incorpora os anteprojectos do MPLA e da ND.

Em relação a matriz A de Base Presidencial ela contém 368 artigos incluindo na Parte IV da Garantia e Revisão da Constituição os Limites materiais de revisão e uma Parte V da disposições Finais e Transitórias.

Em defesa dos interesses mais sublimes dos angolanos, de entre várias inovações que a Matriz A apresenta podemos salientar para começar no Preâmbulo (leitura comparativa);

Nos princípios fundamentais do Projecto, no seu Artigo 2º, afirma e nós citamos “A Republica de Angola é um Estado Democrático de direito, que tem como fundamento a unidade nacional do povo de Angola, a dignidade da pessoa humana, a soberania popular, a democracia representativa e participativa, o pluralismo de expressão e de organização política, a separação e o controlo recíproco de poderes entre os órgãos de soberania e o primado da Constituição e da Lei.”Fim da citação.

O art.º n.º 7 contém uma questão muito importante que é a Supremacia da Constituição e da Legalidade ou seja no n.1 a Constituição é a Lei suprema da República de Angola e no n.º 2 o Estado subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade democrática devendo respeitar e fazer respeitar as leis.

No art.º 15º, a terra é propriedade originária do povo angolano;

De acordo com o art.º 18º, sobre os símbolos nacionais o n.º2 afirma que, a feitura dos símbolos da República de Angola obedece ao regime de concurso público e no n.º 3 reafirma que os símbolos dos Partidos Políticos e de outras organizações não podem confundir-se ou, ter semelhança gráfica, figurativa ou fonética com os símbolos nacionais.

O art.º 107 fala-nos da iniciativa popular que possibilita aos cidadãos a introdução de uma nova norma, revogar uma norma existente ou vetar a promulgação de uma proposta em curso.

São propostas duas regiões autónomas a Região Autónoma de Cabinda e a Região Metropolitana de Luanda nos art.º 279 e 280 e a partir do art.º 287 há um pacote substancial relativo à organização e funcionamento das autarquias.

Gostaria também de fazer uma referência ao sistema de justiça e concretamente ao Supremo Tribunal de Justiça que na Matriz A art.º 221 o mandato dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça é vitalício e o Presidente do referido Tribunal é eleito pelos respectivos juízes.

4-Passemos agora a nossa atenção para alguns elementos da Matriz C.

Em relação à Matriz C, em Setembro do ano em curso foram introduzidos alguns elementos que não constavam do projecto original e que deu entrada na Assembleia Nacional na data estipulada para o efeito. Estes elementos estão contidos no art.º 100 e 121 segundo o qual o Presidente da República é eleito e citamos” por sufrágio universal, directo, igual, secreto e periódico, nas listas dos Partidos ou coligações de Partidos concorrentes as eleições gerais….” E no nº2 voltamos a citar “é eleito Presidente da República o cabeça de lista do Partido ou Coligação de Partidos mais votado no quadro das Eleições Gerais ao abrigo do art.º 135 e seguintes”. Fim de citação. O art.º 135 a que se faz referência faz parte do Título III do Poder Legislativo ou seja da Assembleia Nacional.

Ainda em referência à Matriz C, o art.º 121 relativo à substituição do Presidente da República diz o seguinte “em caso de vacatura do cargo de Presidente da República eleito, as funções são assumidas pelo Vice-Presidente, o qual cumpre o mandato até ao fim, com a plenitude dos poderes.” O Vice-presidente advém por força do art.º 111 das competências do Chefe de Estado a) nomear e exonerar o Vice-presidente da República de entre personalidades eleitas, no quadro do sufrágio para o Parlamento. E voltando ao art.º 121 no n.º 2, “verificando-se a situação prevista no número anterior ou a vacatura do cargo de Vice-Presidente, o Presidente da República nomeia uma entidade eleita para o Parlamento, para exercer as funções de Vice-presidente, ouvido o Partido ou a coligação de Partidos que apoiou a candidatura do presidente da República, nos termos do art.º 135 e seguintes da presente Constituição

Este é um tema para reflexão de todos os angolanos em relação ao nosso futuro.

5- É desejável e salutar que a sociedade civil participe de uma forma activa no processo constituinte e as Quintas de Debate são parte deste processo que inclui também as conferências realizadas pela sociedade civil que teve como corolário um conjunto de propostas que foram entregues em tempo útil à Assembleia Nacional.

MUITO OBRIGADA

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