14/05/2010

47.º SESSÃO DA COMISSÃO AFRICANA: OMUNGA APRESENTOU A SUA DECLARAÇÃO

Teve início a 12 de Maio de 2010, a 47.ª Sessão Ordinária da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, em Banjul, Gâmbia.
A delegação da sociedade civil angolana presente a esta sessão é constituída por representantes da ACC, AJPD, NCC e OMUNGA.
O estado angolano fez-se representar, a partir de hoje, 14 de Maio, por uma delegação encabeçada pelo Ministro das Relações Exteriores.
A OMUNGA fez hoje a sua declaração junto da Comissão, durante a sessão plenária pública da manhã. O texto complecto entregue no secretariado da Comissão, transcrevemos a baixo:
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Exma. Sra. Presidente da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos
Srs. Comissários
Srs. Representantes dos Estados
Srs. Representantes da Sociedade Civil

DECLARAÇÃO

A OMUNGA é uma associação angolana de âmbito nacional sem fins lucrativos, apartidária e laica que desenvolve acções de promoção e protecção dos direitos da infância e juventude. Fundada a 16 de Junho de 2005, cuja constituição foi publicada no Diário da República de 27 de Dezembro de 2006, III Série, n.º 156. Tem actualmente a sua sede na Rua da Bolama, n.º 2, Bairro da Luz, Lobito, Província de Benguela.

Tem o estatuto de Observador da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos desde 2008.

Angola é Estado membro da União Africana e ratificou a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos através da Resolução da Assembleia Nacional 1/91 de 19 de Janeiro e publicada no Diário da República, I.ª Série, N.º 3/91.

Considerando a Resolução da Comissão Africana de 2004 sobre a Protecção de Defensores de Direitos Humanos em África e a Resolução adoptada pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas de 25 de Março de 2010, 13/13, Protecção dos defensores de direitos humanos, consideramos:

1. O Estado de Angola continua a não criar o ambiente favorável para que os defensores de direitos humanos possam agir sem entraves e de maneira segura – A título de exemplo (a) O Ministério da Justiça continua a não emitir o recibo de depóstio do processo de legalização das organizações de defesa dos direitos humanos e utiliza tal argumento para declarar que as mesmas se encontram em situação ilegal (caso da associação OMUNGA).

(b) O Governo provincial de Benguela violou os artigos 3.º, 7.º e 9.º da Lei 16/91, Lei sobre o direito de Reunião e de Manifestação, impedindo de forma abusiva a realização da marcha “Não partam a minha casa”, organizada em Benguela para 25 de Março de 2010. A marcha pacífica tinha como objectivo protestar contra os processos de demolições, desalojamentos forçados e expropriação indevida de terras que acontecem actualmente em todo o país, especialmente os recentemente acontecidos na cidade do Lubango, província da Huila.

Para o efeito, foram feitas ameaças directas pelo Comandante provincial da Polícia de Benguela aos organizadores num encontro tido no comando provincial da polícia de Benguela a 24 de Março de 2010 pelas 19H00. O governador provincial de Benguela proferiu as mesmas ameaças em encontro tido no governo provincial de Benguela com os organizadores por volta das 11H00 de 25 de Março de 2010.

A partir de 24 de Março de 2010, o governo provincial de Benguela emitiu um comunicado ameaçando a população a não aderir à marcha, divulgado pelas estações locais de rádio. Por outro lado o director provincial da comunicação social, enquanto porta-vos do governo provincial de Benguela, o Comandante provincial da polícia de Benguela e o assessor jurídico da direcção provincial do ministério do interior em Benguela, proferiram declarações ameaçadoras e argumentos falsos sobre a decisão do impedimento da realização da referida marcha, aos órgãos de comunicação social como a Voz da América e a Rádio Nacional de Angola (RNA).

A partir de 24 de Março e todo o 25 de Março de 2010, cerca de trezentos efectivos da polícia de intervenção rápida apoiados por cerca de 30 viaturas de todo o tipo, unidade canina e armamento diverso incluindo granadas de gás, ocuparam e circulavam por toda a extensão do percurso previsto para a realização da marcha. Tal efectivo policial provocou um ambiente ameaçador e demonstrava disponibilidade em intervir através da força, contra qualquer iniciativa de manifestação.

Os órgãos de comunicação social locais foram impedidos de fazer qualquer cobertura à organização da marcha. A Emissora provincial de Benguela (RNA) e a Rádio Morena Comercial não aceitaram emitir o comunicado dos organizadores da marcha, nos espaços de utilidade pública mesmo pagos.

No local de concentração, a polícia de intervenção rápida apreendeu o equipamento do jornalista da TV Zimbu e reteve o jornalista da Rádio Despertar sob várias alegações.

A Emissora Provincial de Benguela (RNA) violou os artigos 64.º, 65.º, 66.º e 67.º do CAPÍTULO V da Lei n.º 7/06 de 15 de Maio, LEI DE IMPRENSA, não permitindo o direito de resposta solicitado pelos organizadores da marcha para 02 de Abril de 2010, em relação à entrevista feita por aquela emissora ao assessor jurídico da direcção provincial do ministério do interior em Benguela.

(c) O governo provincial de Benguela impediu abusivamente a realização da marcha pacífica “Não Partam a Minha Casa” marcada para 10 de Abril de 2010, através de carta dirigida aos organizadores (e mais uma vez violou os artigos 3.º, 7.º e 9.º da Lei 16/91, Lei sobre o direito de Reunião e de Manifestação).

(d) Até à presente data, em violação do artigo 15.º da Lei 16/91, Lei sobre o direito de reunião e de manifestação, o procurador provincial de Benguela ainda não prestou qualquer informação nem avançou para o Tribunal os processos de queixa apresentados pelos organizadores em relação às duas decisões de impedimento abusivo da marcha por parte do governador provincial de Benguela.

(f) A 24 de Março de 2010, agentes da polícia nacional acompanhados por representante da Administração Municipal do Lobito agrediram os defensores Isabel Bueio e Jesse Lufendo (OMUNGA), quando estes faziam o trabalho de acompanhamento da destruição de cerca de 2000 lavras no B.º da Cabaia, Lobito. Foi destruído pela polícia o caça-palavras e apreendida (até hoje) a câmara fotográfica.

2. O Estado angolano continua a denegrir publicamente a imagem dos defensores de direitos humanos considerando-os anti nacionalistas e vendidos ao estrangeiro. – A título de exemplo, a 26 de Março de 2010, o director provincial da comunicação social de Benguela, declarou à Voz da América: “... nem ia propor (o governo) uma negociação com um tipo de organização que precisamente pelo tipo de procedimentos que tem tido que é precisamente motivada por factores que se consideram hostis à posição governamental, que por diversas vezes tem sido vista e tida como principal mentora de movimentos absolutamente antagónicos e de desestabilização da ordem pública e que portanto o governo assumiu a sua posição jurídica, legal. A decisão está tomada. A manifestação está proibida. As populações estão aconselhadas a não acatarem ao apelo que se sabe está a circular por iniciativa da OMUNGA no sentido de mobilizar as pessoas. E portanto estas são as posições...”

3. O Estado angolano persiste em impedir os espaços de consulta e de diálogo com os defensores de direitos humanos – A título de exemplo, a Assembleia Nacional não tomou em consideração as propostas apresentadas por representantes da sociedade civil, durante a fase preliminar do processo constituinte, terminado no início deste ano. Por outro lado, a Assembleia Nacional reduziu, sem aviso prévio nem argumentação, o período de duração do processo constituinte e aboliu a fase de consulta pública, mesmo contra os posicionamentos da sociedade civil.

Deste processo resultou a eliminação das eleições presidenciais específicas passando para um sistema de eleições consideradas “atípicas” e a concentração exagerada de poderes na figura do presidente da república.

4. O Estado angolano continua a não tomar as medidas oportunas e eficazes com vista a impedir as agressões e as ameaças aos defensores de direitos humanos – A título de exemplo (a) a 13 de Março de 2010, por volta das 8H30, 3 indivíduos numa viatura fotografaram as instalações da OMUNGA e puseram-se em fuga em resultado da tentativa de interpelação por parte de membros da organização.

(b) A 20 de Março de 2010, o defensor e coordenador da associação OMUNGA viu ser-lhe retirado o seu passaporte e retido indevidamente, por mais de hora e meia, no aeroporto internacional 4 de Fevereiro, Luanda. Regressava de Nairobi onde tinha participado no Fórum Espaços Africanos de Direitos Humanos organizado pelo Instituto Árabe de Direitos Humanos e apoiado pela Fundação Ford.

5. O Estado angolano continua a perseguir e a deter defensores de direitos humanos tomando exclusivamente em conta as suas opiniões políticas – Como exemplo, em sequência do ataque perpetrado contra o autocarro que transportava a equipa nacional de futebol do Togo, durante o Campeonato Africano de Futebol de 2010, foram feitas em Cabinda, detenções de defensores de direitos humanos como Raúl Tati, padre católico detido a 16 de Janeiro de 2010, pelas 18H30, na residência de amigos; Francisco Luemba, advogado e professor universitário, detido a 17 de Janeiro de 2010, pelas 06H00, na sua residência; Belchior Lansu Tati, economista, detido a 13 de Janeiro, pelas 15H00 na sua residência e o advogado Félix Sumbo, detido a 4 de Abril de 2010 quando regressava na sua viatura vindo de Ponta Negra.

Nesta conformidade, solicitamos à Comissão Africana, recomendar ao Estado angolano:
1. Que cumpra escrupulosamente com o estabelecido na Carta africana, nos diferentes tratados internacionais de direitos humanos e resoluções em matéria de protecção dos defensores de direitos humanos;
2. Que “reconheça publicamente o papel legítimo dos defensores de direitos humanos e a importância da sua acção” como esforço de garantir a protecção destas pessoas;
3. Que crie um quadro jurídico nacional, com a participação das organizações de defensores de direitos humanos, que inscreva as actividades dos defensores de direitos humanos que de forma pacífica promovam e defendam os direitos humanos e as liberdades fundamentais;
4. Que proceda à revisão da Lei 16/91, Lei sobre o direito à reunião e manifestação, que actualmente estabelece limitações ao exercício desses direitos em contrariedade com o conteúdo e forma do estabelecido pela Carta Africana dos Direitos humanos e dos Povos;
5. Que garanta um julgamento justo para os defensores de direitos humanos detidos actualmente em Cabinda;
6. Que convide urgentemente o Relator Especial sobre os defensores de direitos humanos da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, para que visite Angola. Esta visita deve incluir uma deslocação a Cabinda para manter contactos quer com os defensores de direitos humanos detidos como com outros. O relator especial deve ainda visitar e acompanhar a situação das províncias das Lundas (Norte e Sul).
O Relator Especial deve ter ainda a oportunidade de se reunir com as organizações angolanas com o estatuto de observador da comissão africana e demais organizações da sociedade civil que trabalham na temática de direitos humanos.

Por último, e tomando em consideração a candidatura do estado angolano para a sua reeleição como membro do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, solicitamos à Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos que recomende:
7. Que o estado angolano aceite e implemente as recomendações que lhe foram feitas durante o processo de Revisão Periódica Universal das Nações Unidas em matéria de Defensores de Direitos Humanos e Jornalistas.


Sra. Presidente
Muito obrigado.

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