02/06/2016

GTMDH: Posicionamento sobre invasão das terras indígenas do Curoca por interesses privados


GRUPO DE TRABALHO DE MONITORIA DOS DIREITOS HUMANOS EM ANGOLA


O GTMDH-Grupo de Trabalho de Monitoria de Direitos Humanos é uma plataforma de organizações da sociedade civil angolana que trabalham para divulgação, promoção, protecção e monitoria dos Direitos Humanos em Angola partindo dos princípios universais dos Direitos Humanos.

Neste âmbito o GTMDH tomou conhecimento do esbulho de terras no município do Curoca, província do Cunene, República de Angola na qual, de acordo com as informações disponíveis, 39 comunidades estão a ser desalojadas ilegalmente de uma extensão de 80 Km de cumprimento e 40 Km de largura, não para o interesse público, mas, pelo que tudo indica, para interesses particulares.   

De acordo com testemunhos recolhidos no local, estão a ser afectadas as cumunidades de Kavango, Milenda, Kandjove, Ovipaka, Eyawo, Okatewe, Namatanga, Hano, Kaoloka, Mayova, Kanuambandje, Kamukúwa, Tchitapawa, Kambelona, Nombelo, Noholongo, Kahalala, Mulavi, Tyiheke-Tchomokati, Mukekete, Eume, Kitetembo, Konongunga, Komudi, Námbua, Ngeyaúla, Munhandi, Mutily, Luenge, Mudingalala, Tyiolofeu, Oufina, Komikambo, Viwayanga, Haykoty, Kononkhanga, Tchikuahepo,Tyiakiti e Tyikoto.

Entre as várias consequências advindas deste esbulho de terra, destacam-se as seguintes:

1. No dia 03 de Dezembro de 2015, algumas comunidades foram surpreendidas com a entrada de tractores nas suas terras, derrubando e queimando diversas árvores, incluindo algumas com valor medicinal, frutífero e alimentar, provocando a devastação do pasto e a destruição de cemitérios. Tudo isso ocorreu ante o olhar passivo de agentes da Polícia Nacional.
  
2. O acto de esbulho está a ser acompanhado de ameaças de prisões a cidadãos inocentes e de detenções ilegais, levadas a cabo por agentes da polícia nacional. A título de exemplo, no dia 08 de Abril de 2016, (06) seis membros das comunidades foram arbitrariamente detidos por agentes da polícia nacional, quando pretendiam negociar com os responsáveis da empresa sedeados no estaleiro.

3. Pressionada pelas organizações da Sociedade, a Procuradoria Municipal ordenou liberdade provisória para os membros das comunidades, no dia 12 de Abril de 2016.

4. Usurpação de terras daquela dimensão e nos modos em que ela está a decorrer, põe em risco de extinção os seguintes subgrupos étnico: os ovahimbas, ovandimbas, ovatyavikwas, ovandongoenas, ovankhumbis e ovangâmbwes, estimados em, aproximadamente,  2.129 famílias e 10.675 crianças;

5. Com a perda dos meios de sobrevivência das comunidades, (gado bovino, gado caprino, gado suíno, ovelhas, burros e cavalos) e ante a inacção das autoridades competentes, as comunidades poderão recorrer à força com o fim de assegurar o próprio direito à terra e isto poderá causar consequências graves, tais como revoltas comunitárias, suicídios, represálias, perda da auto-estima, etc

           Diante de tudo isso, as organizações subscritoras deste documento apelam:
  
1. Ao Executivo angolano:

a) Que tome as medidas urgentes e necessárias no âmbito dos compromissos assumidos com a ratificação dos tratados internacionais de Direitos Humanos, tais como a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, entre outros.

b) Que proteja os direitos das comunidades do Curoca tendo em vista o disposto no ordenamento jurídico interno, nomeadamente os artigos 15º, n.º 2 da CRA (sobre os direitos de uso, acesso à terra, liberdade física e segurança pessoal), 21.º, alíneas b), c), d), e) e h) e 37º nºs 1 e 3.

2.    À Assembleia Nacional:

a) Que crie uma comissão de inquérito para avaliar a situação dos Direitos Humanos nas localidades acima citadas e que agende um debate sobre a usurpação das terras comunitárias que ocorre no país, uma vez que, antes da existência do Estado as comunidades já existiam;

b) Que os deputados pelos círculos provinciais acompanhem melhor as preocupações das comunidades que representam na Assembleia Nacional pois, só assim, estarão a justificar a sua representatividade.
  
3.    Ao poder Judicial:  

Que paute pela independência jurisdicional efectiva, agindo imparcialmente e punindo os autores morais e materiais das injustiças sociais, económicas, ambientais e culturais que ocorrem naquela parcela de Angola.

4.    À Comunidade Internacional:

a) Que continue a monitorar a situação dos Direitos Humanos em Angola, bem como o grau de cumprimento das recomendações endereçadas ao Estado angolano pela Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos da União Africana e pelo Conselho dos Direitos Humanos através do mecanismo da RPU-Revisão Periódica Universal das Nações Unidas.

           
Pelas Organizações subscritoras:
ACC - Associação Construindo Comunidades

ADRA – Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente

AJPD – Associação Justiça, Paz e Democracia

AJUDECA – Associação Juvenil para o Desenvolvimento
Comunitário de Angola

Associação MÃOS LIVRES

ANGOLA 2000   

Associação OMUNGA

FORDU – Fórum Regional para o Desenvolvimento Universitário

FMJIG – Fórum de Mulheres Jornalistas para Igualdade no Género

MBAKITA – Missão de Beneficência Agropecuária do Kubango, Inclusão, Tecnologias e Ambiente

MOSAIKO - Instituto para a Cidadania

MWENHO – Associação de Mulheres vivendo com HIV/SIDA

NCC – Centro Nacional de Aconselhamento

OSISA/A – Fundação Open Society- Angola

PMA – Plataforma Mulheres em Acção

RNP + Angola – Rede Nacional de Pessoas vivendo com VIH/SIDA

SCARJOV – Associação de Reintegração de Jovens e Crianças à
Vida Social

SOS Habitat – Acção Solidária


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